Friday, April 27, 2007

Heróis da Literatura

Estava relendo O Cortiço, quando vi uma passagem que chamou muito minha atenção: “Ele (João Romão) propôs-lhe morarem juntos e ela concordou de braços abertos, feliz em meter-se de novo com um português, porque, como toda cafuza, Bertoleza não queria sujeitar-se a negros e procurava, instintivamente, o homem numa raça superior à sua.”

Fiquei, então, a refletir sobre o escritor como fruto de seu tempo, e muito me custou admitir Aluísio Azevedo preconceituoso – muito embora, agora, vejo que era anacrônico o meu pensamento.
Após alguma reflexão, concluí que o escritor é um veículo por onde se expressa seu tempo. As idéias que tanto lhe atribuem genialidade são, na verdade, não apenas resultado de algo individual, mas, também, o estopim de um processo de mudanças culturais construídas ao longo de um período. Seus enredos são o ponto de encontro dessas idéias que, agora, possuem um solo fértil de condições adequadas para a germinação de uma nova literatura e cativação de leitores propícios/receptivos, às suas idéias, caso contrário, o escritor corre o risco de ser incompreendido e ter sua obra perdida.
Não pretendo desmerecer o mérito dos homens da escrita. Machado de Assis, por exemplo, foi único, e foi necessário muito esforço para que ele construísse sua obra, esforço que ele, e mais ninguém, alcançou.
Os grandes escritores, são heróis das idéias, os mitos mais reais que nos circulam. Sorte nossa chegar aos nossos ouvidos seus nomes e, nas nossas mãos, suas obras. Afinal, certamente, para meu Eu atual, seria incompleto ser, existir, sem conhecer as obras de meu querido amigo Aluísio Azevedo.
Listening to: Frank Sinatra - Moon River

1 comment:

Anonymous said...

Olá André,

O escritor está comprometido com seu tempo, com as questões do seu tempo (pelo menos para aqueles que se preocupam com ele e não vivem em seu mundinho particular). Reconhece seu engajamento pessoal, sua paixão. E justamente por isso torna crucial a questão da verdade. Não uma verdade pretensamente objetiva e imparcial (e por isso “científica”). Mas a busca da verdade como compromisso ético moral para retratar a realidade e fazer os seus livros. Eu não achei que Aluísio Azevedo foi preconceituoso, afinal se a literatura é uma espécie de ficção (podendo ser mentirosa, ou não) que, através da arte, copia a vida para retratar, esmiuçar e até mesmo destrinchar novos caminhos para explicar a própria vida, parece paradoxal que uma mentira, ou melhor, uma invenção ficcional possa interpretar melhor os liames existenciais do mundo, mesmo comparado à literatura tida como realista, no sentido de narrar a “vida como ela é”, modelo preferencial das literaturas ocidentais, ele então só quis mostrar um pensamento de uma personagem preconceituosa inserida em seu contexto social na sua própria época e espaço (e quem sabe ainda hoje há pessoas que pensam dessa mesma maneira que ela...).
Ele sabe que a verdade “total”, pura, cristalina é impossível de ser atingida. Então o escritor chega aos “retalhos” da verdade, pedaços parciais, faz o seu conto, explora as personagens para no final transmitir o seu recado. Mas a busca por esta verdade — que ele sabe que, de certa forma, nunca será atingida - é o que o move e o faz estar atento a qualquer forma de manipulação da narrativa do seu cotidiano. Não apenas do passado, mas também do presente, afinal, sabemos de tudo o que está acontecendo ao nosso redor?

Termino esse comentário com essa frase:
"Não vemos as coisas como elas são, mas como nós somos." Anais Nin.

Veja esse link, muito interessante e tenho certeza que gostará:
http://nuevomundo.revues.org/document1560.html

OBS: Eu só quero ver você inventar de dizer que não gostou do meu texto super pesquisado e revisado...
=p